Nem sei ao certo como começar a narrativa. Na verdade, nunca gostei muito de histórias tipo 'Relato de Parto' então a ideia aqui não é escrever nada deste tipo. Mesmo depois que engravidei evitava ao máximo ler sobre experiências e histórias alheias justamente por saber e ter consciência que toda gravidez é única, e que experiências, traumas, histórias vividas por outras são necessariamente de
outras pessoas. Não tem como comparar, como projetar, como dizer que com você será diferente ou igual. Mas esta é a minha opinião e sei que muitas mulheres se sentem motivadas e inspiradas com histórias alheias, é o modo delas de buscarem informações, criam parâmetros, se emocionam, solidarizam...para quem curte, a internet esta repleta de blogs maternos e outros tantos com relatos completos e detalhados da experiência vivida por diferentes mulheres. Mas não é o caso aqui. Quero somente escrever sobre este dia em que vivi uma experiência muito intensa, marcante, que merece ser contada aqui como mais um registro desta minha grande aventura que é viver.
Era uma quarta-feira de cinzas, 10 de fevereiro. Senti dores a semana toda, mas neste dia e de madrugada, lá por volta das 4h da manhã a dor ficou mais intensa, mais frequente, localizada nas costas e tentei lidar com ela até que percebi que havia um padrão, a dor vinha com frequência, mais ou menos a cada vinte minutos. Lá pelas 6h da manhã acordei o marido, comentei sobre o que estava acontecendo e ao ir ao banheiro desconfiei que havia vazado o tampão do colo do útero (não sabia se era isto mesmo, mas como era uma coisa 'diferente' assumi que era isto...). Tomei um banho e começamos a nos preparar para ir ao hospital. Eu havia combinado com meu marido que queria passar o menor tempo possível no hospital, que tinha pavor de chegar lá, me analisarem e mandarem eu voltar para casa, então combinamos que passaríamos o maior tempo possível do pré-parto em casa. Mas aí vem a realidade: a dor bateu tão forte que eu queria ir imediatamente para o hospital. Todo o planejamento idealizado cai por terra quando a gente esta com dor. Meu marido ponderou, disse que seria bom irmos somente quando a bolsa estourasse, mas nem precisamos discutir, logo após ele falar isto, a bolsa estourou. O engraçado é que ficamos a semana toda esperando os sinais de trabalho de parto começarem e o fato é que tudo aconteceu de uma vez só: primeiro as contrações contínuas, logo depois o vazamento do tampão, e em seguida, as 06h30, a bolsa que estourou, tudo rápido e com a dor cada vez mais forte, difícil de lidar.
Revisamos as bolsas da maternidade, minhas coisas e as dele, e saímos rumo ao hospital. No caminho eu sentia as contrações e me retorcia no carro, torcendo para chegar logo. No hospital fui rapidamente atendida por plantonistas, que analisaram que eu estava em trabalho de parto com 3 cm de dilatação. Da recepção, fui para uma outra sala onde troquei de roupa e fiquei à espera da papelada ficar pronta para internação. Junto comigo chegaram mais umas duas mulheres em trabalho de parto também, uma gritava feito doida o que não me deixou muito a vontade. Não fiquei muito tempo ali, mas para mim era uma eternidade esperar e após algum tempo meu marido apareceu e me levaram para a sala de pré-parto. Uma sala exclusivamente reservada para as mulheres que estão em trabalho de parto normal ficarem com seus acompanhantes. Lá tinha bola de pilates, cadeira para massagem, banheiro privativo (e foi por isto que escolhi o Hospital Renascença em Campinas-SP), e eu usei tudo aquilo. Sentia tanta dor que se falassem que eu tinha que plantar bananeira chupando cana, eu faria...Me recomendaram um banho quente, eu tomei, massagem com a bola de pilates, também fiz, e meu marido ficou comigo todo o tempo me ajudando a passar por aquilo com infinitas massagens e apoio de todo tipo. Em um determinado momento, uma daquelas mulheres que chegaram junto comigo ao hospital estava a vias de fato para ter seu bebê, e me pediram para trocar de sala com ela, pois a sala onde eu estava era maior e mais equipada, e como eu ainda estava evoluindo no processo, topei trocar. O problema é que eu fui para a sala onde ela estava, mas ela não aguentou sair para ir à minha sala e eu tive que presenciar os berros de quem estava tendo um parto normal. Ela gritava tanto, e aquilo e assustou de uma maneira que eu comecei a chorar. Chorei de medo, de ansiedade, de solidariedade. E então toda equipe a levou para a sala de cirurgia e não escutei mais nada. Quando retornei para a sala onde eu estava, reclamei com a enfermagem e com a médica que me atendia pois achei desnecessário me fazer presenciar aquilo. Pediram desculpas e me falaram que a dilatação dela evoluiu tão rapidamente que não deu tempo nem de aplicarem anestesia, ou seja, a mulher teve um parto natural, por isto ela gritava tanto e que eu não precisava me preocupar pois o meu não estava evoluindo assim. Mas eu com minhas dores nem tive muito tempo de ficar brava ou insatisfeita, tinha outra coisa para focar e nem escutei direito as explicações que me deram. Continuei ali, hora após hora esperando o parto evoluir, a dilatação aumentar, e assim fomos até cerca de 7 cm, e então estagnamos.
É muito louco pensar que durante toda minha vida eu sempre tive muito medo do parto, de sofrer durante o processo sabe? Eu afirmava que nunca passaria horas em trabalho de parto, porque afinal, para que sofrer né? Mas surpreendentemente passei mais de 8 horas em trabalho de parto tentando fazer meu filho vir ao mundo de forma normal. Eu sabia que era o melhor para ele e para mim e fiz de tudo para que isto acontecesse e nem percebi que minha escolha estava sendo totalmente ao contrário de tudo aquilo que eu afirmava. A nossa motivação passa a ser fazer o melhor possível para o bebê, seja lá o que isso signifique. Na verdade, eu nem pensava muito que seria difícil, encarei com positividade achando que seria um processo intenso mas rápido. Mas não foi bem assim, e apesar dos esforços o parto idealizado não aconteceu. Depois de tantas horas tentando o parto normal realizamos uma cesárea de emergência. Foi tudo muito rápido, não demorou 20 minutos e eu já estava na sala de cirurgia, anestesiada, pronta e então eu ouvi um choro forte e eu também chorei de emoção por vê-lo nascer forte e saudável depois de tudo aquilo que vivemos.
Alívio.
Levaram o bebê junto com o pai para os procedimentos médicos, e logo depois trouxeram ele de volta e então não nos separamos mais. Nos levaram para sala de recuperação, e eu que não tinha a menor ideia de como era uma cesárea estranhei quando percebi que não sentia minhas pernas. Foi estranho. Ali, esperando o efeito da anestesia passar, me disseram para amamentá-lo. Por instinto a gente faz aquilo como se sempre soubéssemos o que fazer.
Tarde da noite fomos encaminhados para o quarto e lá, sentadinha na cama senti como se eu estivesse fora do corpo. Nem sei explicar, mas fiquei aérea, como se não estivesse ali. Era o cansaço, a fome (fiquei em jejum desde a hora que acordei com as contrações), o efeito da anestesia no corpo, a emoção e espanto de ver o bebê ali do meu ladinho, sabendo que horas atrás, ele estava dentro de mim.
Recebemos a família, amigos próximos e exatamente 48 horas depois, fomos para a casa. Apesar de bem assistida, queria muito ir para casa, ansiosa para dormir na minha cama, usar minhas coisas e mostrar nossa casa para o bebê. Recebemos mil instruções de como cuidar do bebê e do meu pós operatório (e eu só pensava como iria me lembrar de tudo aquilo), uma papelada da alta, fizemos uma oração e então, fomos para casa viver novos e únicos dias, agora como pais.